domingo, 17 de maio de 2015

Myrtus Reserva 2008




 
Se o Arinto tem em Bucelas (às portas de Lisboa) o seu terroir natural, capaz de fazer dos melhores brancos portugueses com complexidade e capacidade de envelhecimento notáveis, porque será que a região é quase desconhecida e os vinhos que chegam à grande distribuição estão no patamar dos três a quatro euros*?
 
Esta é a pergunta para um milhão de dólares... Naturalmente, apanhar um vinho dum patamar superior e com alguma idade, revela-se muito difícil para o consumidor normal, o que acaba por não ser muito importante, já que provavelmente não ia gostar. E este deve ser o dilema de quem faz vinho em Bucelas: entre escoar a produção anual ou calma e paulatinamente ir mostrando a excelência da região e a sua capacidade para produzir vinhos únicos (na região dos vinhos verdes isto já começou a dar frutos...)

 
 
Este Myrtus Reserva é de 2008 (a informação aparece quase escondida no contra rótulo) e é um vinho fascinante. Aberta a garrafa, aparece exuberante no nariz com notas de frutos tropicais e alguma tosta. Na boca é seco, fresco e austero. À medida que vai abrindo, começam a sobressair as notas de tosta (nada de baunilha), que não incomodam nada. Quase sete anos após a colheita, está num ponto muito bom de evolução, denotando que viverá anos em garrafa, muito porreiro para beber assim, sem mais nada, mas muito melhor a acompanhar comida. Os 14º de álcool não se notam, sobressaindo a estrutura e frescura do vinho.
 
Um vinhão, feito na Quinta da Murta pelo Enólogo Nuno Cancella de Abreu com o Hugo Mendes, actual responsável pelos vinhos da Quinta e que muito tem feito pela divulgação da região. Este 2008 foi o "primeiro vinho" do Hugo e na Murta, o vinho mudou de perfil. Ficou mais austero, mais fechado, a pedir cave...

 
Para acompanhar este vinho, fiz um empadão de bacalhau, cenouras e espargos.
 
Comecei por escalfar uma posta de bacalhau (do topo superior do bicho) e limpei-a de peles e espinhas. Reservei a carne.
Cortei uma cenoura em pedaços pequenos e escalfei-a até ficar al dente. Reservei.
Cortei uma cebola em meias luas muito finas, juntei dois dentes de alho picados, um pouco de sal, mistura de pimentas e levei a refogar em lume brando, juntamente com uns poucos de espargos verdes que cortei em rodelas, depois de ter tirado e reservado as cabeças. Quando a cebola se apresentava translucida, juntei o bacalhau, envolvi tudo, tirei do lume e deixei repousar com o tacho tapado para suar.
Fiz um puré de batata, temperado com manteiga e um pouco de noz moscada.
 
Juntei então o puré de batata, o refogado, as cabeças dos espargos e a cenoura, envolvi tudo muito bem, corrigi de temperos e deitei a mistura num tabuleiro de barro. Cobri com uma mistura de queijos ralados e levei ao forno até o queijo derreter. Tive o cuidado de deixar tudo muito pouco tempo ao lume, para que a cenoura e os espargos mantivessem a sua crocância. Servi com umas poucas de azeitonas negras.
 
 

 
Para a sobremesa e ainda a acompanhar o vinho, uns folhadinhos de queijo de cabra (aquele da Palhais em cilindros - porreiro e barato) e doce de chila, que também ligaram lindamente com o vinho.

 
* temos apenas o Morgado de Santa Catherina, que será a excepção que confirma a regra...
 

domingo, 10 de maio de 2015

Gouvyas 2006




 
João Roseira e Luís Soares Duarte lançaram em 1996 o primeiro Gouvyas (apesar de só terem constituído a empresa em 1998), de que dei nota aqui. João Roseira é a cara da Quinta do Infantado, Luís Soares Duarte um dos mais brilhantes enólogos portugueses e o projeto Bago de Touriga vai sendo seguido atentamente como um filão de grandes vinhos do Douro.
Depois de 2002, o ano maldito que apesar de tudo deu grandes vinhos, 2006 conseguiu ser ainda pior e a maior parte dos produtores não lançaram para o mercado os vinhos de topo. Contudo, na Bago de Touriga, selecionaram uvas de vinhas velhas, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz do Vale de Mendiz e de Foz Côa e fizeram 5.026 garrafas numeradas do Gouvyas.
 

 
João Paulo Martins, provavelmente o melhor critico de vinhos em Portugal provou o vinho em 2010 e deu-lhe 15,5 pontos, referindo que não iria ser um vinho grandioso (in GVP 2011). E enganou-se... Passados nove anos, o vinho está terroso, cheio de notas de boa fruta, balsâmico e dá enorme prazer a beber. Para mim, é o terceiro vinho tinto de 2006 que surpreende pela positiva (os outros foram o Quinta do Vale de Dona Maria e o Redoma). Belo vinho, um dos melhores que provei nos últimos tempos, a mostrar que a inquietude do João Roseira e a sabedoria do Luís Soares Duarte metem lanças em África...
 
 
Acompanhei este vinho com uma peça de entrecosto de porco comprado em Carrazedo de Montenegro que ficou a marinar em vinha de alhos de um dia para o outro e que foi ao forno a assar com batatas e foi acompanhado de uma salada de tomate e cebola, temperada com flor de sal, azeite e vinagre de Murça a que juntei umas poucas de azeitonas pretas.
 

 
Para sobremesa, Toucinho do Céu de Murça e nos pós prandiais, outro vinho do João Roseira e Luís Soares Duarte, com a mão da Fátima Ribas, o Quinta do Infantado LBV 2009. É um LBV não filtrado, o que lhe garante boa evolução em garrafa. Roxo, fresco, jovem, é um dos melhores LBVs que temos. Excelente para beber já a acompanhar queijos, "puros" ou uma boa conversa ou para guardar e ir abrindo para ver a evolução.

 

sábado, 9 de maio de 2015

Marquês de Borba tinto 2013



 
Vinho anunciado como "Genuinamente Alentejano" na Press Release que acompanhava a garrafa, amavelmente enviada pelo Eng. João Portugal Ramos.
 
De Alentejano tem tudo, já que é feito em Estremoz, mas de genuíno, só na cabeça do Produtor, já que foge das notas de compota, do grau alcoólico alto e da maçadoria (será um neologismo?) de que enfermam alguns vinhos do Alentejo.
 
João Portugal Ramos é uma das pessoas que redefine o perfil dos vinhos Alentejanos, com uma sábia escolha de castas e demais praticas de enologia, apresentando aqui um vinho tinto fresco, fácil de beber e com boa aptidão gastronómica. Este Marquês de Borba 2013 apresenta-se jovem e com capacidade de melhorar se consumido daqui a um ou dois anos, cheio de notas de fruta vermelha, roxa e preta (cliché) e com a madeira do estágio a não incomodar.
 
Como é apanágio dos vinhos do Eng João Portugal Ramos, é uma boa escolha no patamar onde se insere, o dos vinhos de cinco euros. Recomendado para ter em casa e muito para quando se tem que se comer no restaurante, desde que não peçam mais do que dez euros por uma garrafa...
 

 
Provei o vinho a acompanhar um naco de entrecosto de porco no forno com batatas novas acolitado por umas folhas de couve lombarda, cozida e salteada em azeite e alho, com umas gotas de vinagre.
 
 *azeite e vinagre Oliveira Ramos, referido aqui.