domingo, 29 de janeiro de 2012

Quinta do Vallado Reserva Branco 2010

Os vinhos da Quinta do Vallado são indubitavelmente uma referência do Douro. A Enologia mais que segura do Francisco Olazabal vai-nos trazendo, ano após ano, vinhos muito consistentes e com boas relações qualidade/preço. É o caso deste branco reserva de 2010. Fino, elegante, com a madeira magistralmente trabalhada e a não se impôr, uma acidez fantástica são as virtudes dum grande vinho branco do Douro. Não é muito exuberante, mas é seguro, muito seguro. Estou fã. Não é barato (cerca de € 16,50) mas oferece muito, ao preço...  


Esteve muito bem a acompanhar um almoço com uns folhados de chévre e mel de entrada e um bacalhau à Conde da Guarda.


Os folhados foram feitos com massa folhada de compra, queijo de cabra Palhais e mel. Cortei circulos de massa com um copo. Deitei uma rodela de queijo por cima (com cerca de 5 mm de espessura) e um pouco de mel. Deitei outra rodela de massa e fechei com um garfo. Depois foi levar ao forno pré-aquecido a 210º C até dourar a massa. 

sábado, 28 de janeiro de 2012

Adega de Pegões Touriga Nacional 2009

Gosto dos vinhos varietais do Eng. Jaime Quendera e da Adega de Pegões. Bem feitos e com um preço cordato, são vinhos muito honestos que nos permitem admirar as castas a solo sem pagar uma fortuna. E este Touriga Nacional 2009, que até teve 16 valores na recente prova de vinhos de TN da Revista de Vinhos é um belo vinho, ao preço (a rondar os cinco euros). O lado floral levemente presente, algo mineral, num corpo muito bem composto e que dá uma muito boa prova.


Esteve muito bem a acompanhar uma costeleta de vitelão nacional, simplesmente grelhada e com um molho de azeite com um pouco de alho, louro e pimenta e vinho branco e com umas batatas a murro.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Da Índia a Borba com um Estufado em Touriga de Palmela

Eu, admirador das comidas de tacho, me confesso. E não há muitas coisas melhores do que uma galinha da Índia, ainda por cima longamente miscigenada com as nossas galinhas, tendo atingido o porte de um frango "do campo" e tendo andado a vida toda a picar o chão, a ser estufada. Carne vermelha e um porte garboso tornam esta ave numa coisa muito especial para se levar à mesa.

Cortei-a em pedaços e deixei-a numa caixa a marinar, envolta em alho e nos restos de uma garrafa de Adega de Pegões Touriga Nacional 2009 (um tourigo muito competente...) durante um par de dias e no frigorífico.
Chegada a hora de a preparar, deitei uma mistura de azeite e banha de porco num tacho de fundo grosso e alourei os pedaços da galinha devidamente escorridos do líquido da marinada. Juntei cebola picada, uma folha de louro, um ar de pimenta preta, umas rodelas de chouriço de porco preto e uma malagueta seca devidamente esmagada à mão e deixei mais uns minutos; juntei o alho da marinada, um pouco de sal marinho, polpa de tomate e um pouco de massa de pimentão. Mais uns minutos em lume médio a esperto, juntei o vinho da marinada e cobri com vinho branco e um pouco de whisky novo. Reduzi o lume ao mínimo e deixei estufar até a carne ficar macia (levou quase três horas, que a galinha era rija).

Para acompanhar, um puré de batata! Batatas a cozer e depois de cozidas, foram envolvidas em manteiga e temperadas com um pouco de noz moscada e depois foi só esmagar as batatas e ir juntando leite até o puré ter a consistência desejada.


A carne era uma coisa do outro mundo de sápida e ficou no ponto, macia, sem se desfazer...


Para acompanhar, escolhi um clássico do Alentejo, o Adega de Borba Reserva, aqui na edição de 2008. É um vinho que me tem passado ao lado, mas que vale a pena conhecer. Feito com Aragonez, Trincadeira, Castelão e Alicante Bouschet, é um vinho muito equilibrado. O Castelão (digo eu sem saber) aligeira-lhe a cor e o corpo e o vinho não é madurão nem guloso. Está lá tudo o que se quer de um vinho do Alentejo (alguma opulencia, bom corpo sem ser excessivo) e ao mesmo tempo, não está o que não quero, como a compota ou a baunilha. Como clássico, é caro para os € 8,98 que custa nas Grandes Superfícies, mas a marca paga-se. O vinho é bom, mas não esteve à altura deste estufado, que pedia um vinho mais vinho, mas no dia seguinte, este Borba esteve muito bem a acompanhar uma moelas estufadas. Bom para beber uns anos depois da colheita ou para guardar na garrafeira, já que potencial de guarda não lhe falta :)

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Bolo de Iogurte

Nesta 64ª trilogia com a Ana e o Luís, o tema é o iogurte. Não é ingrediente que tenha grande expressão na nossa cozinha, embora as possibilidades sejam mais que muitas. Quando estava a pensar o que fazer com este ingrediente, pareceu-me que seria interessante apresentar uma variante ao clássico mais que clássico bolo de iogurte, mantendo o sabor suave e acre do iogurte, mas acrescentando-lhe uma textura apudinada que o torna excelente para terminar uma refeição em beleza...  


E já que se fala de bolo de iogurte, a receita terá que ter como medida o copo do iogurte, coisa parva, já que todos os ingredientes ficam agarrados ao copo, mas pronto...

1 copo de iogurte natural
2 copos de açúcar
1/2 copo de manteiga
3 ovos
1/2 copo de farinha sem fermento

Deita-se o açúcar numa bacia e incorpora-se a manteiga com as mãos até obter uma pasta homogénea. Juntam-se os ovos, um a um, mexendo sempre. Junta-se o iogurte e envolve-se. Deita-se a farinha numa peneira e vai-se peneirando para a mistura e envolvendo com a colher de pau.
Pré-aquece-se o forno a 180º C e unta-se uma forma de bolo inglês com manteiga. Polvilha-se com farinha e deita-se-lhe a massa do bolo. Vai a cozer na forma coberta com filme metálico durante trinta e cinco minutos. Desenforma-se e cobre-se com icing sugar.  


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Pai Abel Branco 2009 e um Chicharro no Forno

"prefiro ter mil clientes a comprar uma caixa de vinho do que um a comprar mil caixas", disse Mário Sérgio Alves Nuno em entrevista ao Portugal Global. E em relação a alguns vinhos, até podia limitar a oferta a uma só garrafa, caso deste Pai Abel 2009, acabadinho de lançar e já esgotado no produtor.
Foram 1380 garrafas dum vinho branco de Bical e Maria Gomes de vinhas com vinte anos estagiado em pipas de carvalho francês (da Borgonha) de 225 litros e feito em homenagem ao pai do Mário, o Sr. Abel Dias. Sente-se o terroir da Fogueira, sentem-se os garrafeiras brancos da casa, sente-se a Bairrada!       


João Afonso refere na edição deste mês da RV que se trata de um upgrade ao Garrafeira Branco das Bágeiras. Confesso que não o entendi bem assim, tendo achado que se trata de uma outra abordagem ao Garrafeira. Como referi acima, o vinho respira Bairrada, daquela que dava grandes vinhos e que o Mário Nuno tão bem nos vai mostrando... Há uma finura acrescida no garrafeira normal (que é tudo menos normal, já que é um dos melhores brancos portugueses) que este Pai Abel compensa com uma estrutura de aço à prova de tudo. Curiosamente, embora pareça ter muitos anos de vida pela frente (vamos é a ver se daqui a uns 10 anos alguém ainda tem uma garrafa que seja...), é um vinho que dá uma bela prova neste momento. Opulento, como os melhores garrafeiras da casa, aparece mineral e é um vinho muito sério, como o atestam os 18 valores que a RV lhe atribuiu. E um vinho destes a pouco mais de € 17, é um achado. Embora esgotado no produtor, ainda há na Niepoort Projectos e na Garrafeira Nacional. Imperdível mais imperdível, não conheço :)

E para provar este vinho, escolhi um peixe pobre, mas que se bem trabalhado, dá muito prazer: o chicharro. Um peixe com meio quilo, devidamente limpo e deixado uma meia hora a tomar sal. Enquanto isso, pré-aqueci o forno a 180º C e deitei cebola em rodelas, tomate, mini-pimentos vermelhos, um limão em quartos, dois dentes de alho e batatinhas novas num tabuleiro de barro. Temperei com pimenta, pimentão doce, uma folha de louro, uma haste de hortelã e meia malagueta seca esmagada, bem como o competente borrifo de vinho branco, o fio de bom azeite e umas pedras de sal marinho. Levei o tabuleiro ao forno durante cerca de meia hora e findo esse tempo, virei as batatas. Deixei mais meia hora e juntei o peixe. Passado um quarto de hora, virei o peixe e deixei mais um quarto de hora, antes de servir.       


O peixe cumpriu a velha máxima de que está cozido quando deixa de estar crú. Ficou delicioso e suculento e foi excelente companhia para tão distinto vinho.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Beignets de Fraises

Nesta 63ª trilogia com a Ana e o Luís apeteceu-me lançar o tema dos fritos doces. Claro que como em todos os temas, há uma grande margem de escolha e foi com deleite que vi a Ana a empolmar ananás, trazendo-me à lembrança alguns jantares de comida chinesa que terminavam quase sempre com a maçã ou a banana fá-si e saké e o Luís a ir às deliciosas bolas de berlim como já não as há.

Eu optei pelo uso dum fruto que faz as minhas delícias mas que muito raramente apanho nas condições desejadas, o morango. Na verdade, lembro-me dos pequenos e deliciosos morangos que as gentes da Gândara cultivavam à beira dos poços no verão e das nossas incursões nocturnas que deixavam as plantações limpinhas, depois de nos saciarmos com tão bons morangos, no verão. Depois foi ve-los a aparecer cada vez mais cedo, pela páscoa, vindos de huelva, corados da estufa e gordos da água, com aroma e sabor deslavados. E, tirando umas poucas semanas no ano em que provo os que o meu pai planta no quintal, o resto do ano, são mesmo estes, grandes, lindos e deslavados que tenho à disposição.  


E para fritos doces, escolhi estes Beignets de Fraises que fui buscar às Receitas com História - os segredos do Aviz Hotel, de que já tinha falado anteriormente. Uma compilação de pratos do Hotel Aviz, feita em 2000. 

20 morangos grandes
1 ovo
40 g de manteiga
1 chávena de farinha peneirada
1 chávena de leite
óleo de amendoim
açúcar em pó

Faz-se um polme, mexendo bem com o ovo batido ao de leve, a manteiga, a farinha peneirada e o leite. Passam-se os morangos por farinha e depois pelo polme. Fritam-se no óleo bem quente até estarem dourados. Secam-se com papel absorvente e polvilham-se com açúcar em pó. Servem-se mornos.


sábado, 14 de janeiro de 2012

Porco Estufado com Castanhas | Alento Reserva 2008

Depois de ter provado o Alento normal, de Luís Viegas Louro (aqui) e de ter visto que o Alento Reserva de 2009 teve uns robustos 17 pontos na edição de Dezembro da RV, abalancei-me a provar o Reserva, mas aqui na edição de 2008. Pareceu-me que o vinho e um clássico prato de porco com castanhas se iam dar bem, pelo que o preparei asinha:

Pedaços da pá ou da perna de porco (com pouca gordura) que deixei a marinar de um dia para o outro em vinho branco e alho. Depois foi deitar banha de porco num tacho de fundo grosso e alourar os pedaços do bácoro depois de os escorrer da marinada. Juntei cebola picada, os alhos da marinada, uma malagueta seca moída, uma folha de louro e um ar de pimenta preta e deixei refogar em lume médio uns minutos. Juntei polpa de tomate, deixei mais uns minutos em lume esperto e juntei o líquido da marinada. Deixei estufar em lume muito brando até o porco estar macio. Nessa altura juntei castanhas (congeladas), deixei reganhar fervura e deixei mais uns dez minutos até amaciar as castanhas, sem deixar que se desfizessem. Servi com uns grelos cozidos e salteados em azeite e alho.  



E o Alento esteve muito bem a acompanhar este prato. Aragonez, Alicante Bouschet, Touriga Nacional e Syrah a compor um vinho atraente e guloso, mas com bela frescura e acidez. A opulência de Extremoz e dos vinhos do Alentejo está lá, mas bem balançada com a frescura desejada para este vinho brilhar à mesa. Por pouco mais de dez euros tem-se um vinho muito fácil de beber e de gostar, mas com complexidade qb para agradar ao enófilo mais empedernido.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Soalheiro Alvarinho 2011 e o Azeite Romeu

A chegada ao mercado da mais recente colheita do Soalheiro é um acontecimento que estimo particularmente, ou não fosse este um dos mais consistentes brancos portugueses. Ao contrário da maior parte das marcas, este Soalheiro vem cedo para o mercado (logo por alturas do natal, eu é que nunca o apanhei tão loução) e em geral vem tão pronto a ser bebido como a ser esquecido na cave por uns anos (dito de outra forma, haja dinheiro e comprem-se umas quantas caixas que o vinho promete fazer as delícias de quem o beber e durante uns bons anos). E se a qualidade, mais pó, menos pó, é sempre alta, o preço lá se vai mantendo, a rondar os € 8,50. Como aprecio as notas mais vegetais que este vinho apresenta em novo, apeteceu-me prová-lo com singela pescada cozida, acompanhada de nabos e seus grelos, batatas, cebola e o (desnecessário) ovo (da gula).


Um prato simples e banal, que brilhou ao ser regado por um dos melhores azeites portugueses, o Romeu, de Mirandela. Na verdade, o azeite Romeu, puro como deus o deu, é bom, muito bom, parece que estamos a comer azeitonas vivas, sem processamento. Provar este azeite é como ouvir uma excelente gravação num sistema de áudio high-end bem afinado. Não é barato (cerca de € 6,75 cada garrafa de meio litro), mas proporciona muita alegria às papilas :)


Este Soalheiro 2001 está em muito bom nível, sendo indubitavelmente uma compra obrigatória. Grande vinho... (mais informação, aqui, no site do produtor)

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Trilogia do Cozido, o do Butelo

Nesta trilogia número 62, a mando do Luís, eu e a Ana fomos ao cozido. E cozidos há muitos, mais pobres ou mais ricos, mas sempre comida de conforto, de tempo frio, a fumegar no prato. Como sou adepto dos cozidos simples de enchidos a pontuar os vegetais com os seus sabores fortes, trago aqui um cozido feito com um fantástico enchido de Trás-os-Montes, o Butelo.


Tradicionalmente feito com feijocas nas suas vagens (as cascas ou casulos) como este cozido de José Cordeiro, sacado da página de Hélio Loureiro, é um prato obrigatório do receituário transmontano. Difícil será encontrar as ditas cascas fora do terroir de origem. Numa apropriação simples substituí as cascas pelas feijocas acolitadas com uns grelos. E é assim: Coze-se o butelo durante uma hora e meia, há quem alvitre que se rejeite a água da cozedura (aqui), juntam-se os vegetais e, estando cozidos, servem-se.




domingo, 8 de janeiro de 2012

Vinhos Gravato - Vinhas Velhas 2008 e Touriga Nacional 2006


Coriscada, Meda! Alí entre o Dão e o Douro Superior, temos a Quinta dos Barreiros, do Eng. Luís Roboredo. Os vinhos são feitos para a mesa, embora tenham os mais que merecidos encómios da crítica. Para começar, um palhete (de que tinha dado nota aqui) feito de uvas brancas e tintas, tal como seria a maior parte dos vinhos do antigamente e que no que a mariadagens diz respeito, vai mais além do que a maior parte dos rosados da praça. E da colheita de 2008, há um Gravato Tinto Vinhas Velhas, feito com Rufete e temperado com a branca Síria. Um vinho tinto que se pode beber fresco (a 14º C) e que tem uma acidez e frescura fantásticas. Outra jóia da coroa é o Touriga Nacional 2006, um vinho profundo, tenso e intenso, escuro, com um belo balanço entre o lado floral da touriga, bons frutos vermelhos e uma (mais uma vez) excelente aptidão gastronómica. São vinhos de não-terroir, ou melhor dizendo, de um outro terroir, ali entre o calmo dão e o infernal douro superior, feitos com paixão, para a mesa.   

Não são vinhos que se encontrem em qualquer sítio, infelizmente. Encontrei-os na Mercearia do Molhe, na Foz do Douro. O Vinhas Velhas a € 7,70 e o Touriga Nacional a € 9,85, mas estão à venda noutros sítios (Wine o'Clock, Talho do Túnel - Foz do Douro ou ainda através do site do produtor).

O Vinhas Velhas esteve muito bem a acompanhar umas razoáveis empadas de galinha e outras de camarão da supracitada Mercearia do Molhe (que tem muitas coisas boas, como manteiga das Marinhas e o fantástico azeite Romeu) como entradas num jantar onde pontificou um entrecosto de porco no forno, com as suas batatas e bons grelos cozidos e salteados em azeite e alho, este acompanhado pelo Touriga Nacional 2006.


E em jeito de nota final, diria que o tourigo é excelente, ainda mais a este preço. Do Vinhas Velhas, é de salientar a aptidão gastronómica. É um tinto que não perde muito em ser refrigerado e bebido fresco e que acompanha pratos para os quais não se encontram parceiros naturais, como este empadão que fiz com as sobras do entrecosto e que acolitei com puré de batata a que juntei parmesão (para além de leite e um ar de noz moscada), tendo usado o mesmo parmesão na camada final. Belos vinhos a preços cordatos...


quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Espetadas de Maçã e Morcela da Beira

Esta semana temos espetadas nestas trilogias com a Ana e o Luís. E se espetadas há muitas, eu retenho as madeirenses em pau de louro e as de mexilhões à moda de Aveiro, como boas espetadas, que se destacam da maioria pela simplicidade e assertividade dos ingredientes. Claro que tudo se pode espetar e não será muito dificil conseguir fazer espetadas interessantes e harmónicas, mas não é de todo, o tipo de preparação que me ponha a dar pulos de contente. Mas um tema trilógico é sagrado e resolvi fazer umas espetadas com sabores que comprovadamente se ligam bem, caso das morcelas da beira e das maçãs. Na chapa bem quente e com um fio de azeite, salteei morcela em rodelas de um centimetro de espessura e montei as espetadas alternando a morcela e maçãs cortadas em quartos. Levei de novo à chapa com a gordura para aquecer e aromatizar a maçã. Ao servir e já no prato, deitei umas gotas de sumo de limão e um fio de azeite. Come-se assim, como entrada, sem precisar de acompanhamento :)       

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Coelho em Vinho Tinto | Pequenos Rebentos Touriga Nacional 3 Barricas Grande Reserva 2008

Há um princípio básico e incontornável na cozinha que diz que não se fazem excelentes pratos sem excelentes ingredientes. Apesar de tudo e ainda assim é possivel, com ingredientes banais e muita maquilhagem, fazer um bom prato. E se há poucos pratos de caça de que goste mais do que do coelho à caçador (refiro-me ao nome que se dá nas beiras ao coelho marinado em vinho tinto e estufado e não às preparações da estremadura, com vinho tinto e sangue, mas sem marinar e que são denominadas à caçadora), não é menos verdade que dificilmente consigo gostar deste prato quando feito com o banal coelho do aviário. Ainda assim e recorrendo à supracitada maquilhagem (neste caso, o estágio prolongado do coelho na marinada) consegue-se transformar o desinteressante laparoto num muito bom prato. 
Pegue-se num coelho, corte-se em pedaços e deixe-se a marinar durante quarenta e oito horas numa mistura de vinho tinto (60%), vinho branco (30%) e vinagre de vinho tinto (10%), juntamente com uns 6 a 8 dentes de alho esmagados, uma folha de louro e um raminho de salsa.
Leva-se uma frigideira a lume esperto com um pouco de banha e salteiam-se os pedaços do coelho, depois de escorridos da marinada. Deita-se a gordura num tacho, junta-se uma cebola picada e os alhos da marinada e deixa-se refogar uns minutos em lume médio. Junta-se um ar de pimenta e duas colheres de sopa de polpa de tomate e envolve-se tudo, deixando mais uns minutos. Junta-se o líquido da marinada e deixa-se estufar uns vinte minutos em lume brando antes de juntar o coelho (no caso de se usar coelho bravo, junta-se logo, mas no caso do coelho do aviário, que fica pronto mais rapidamente, convém libertar o alcool do vinho previamente). Junta-se então o coelho e a salsa (o ramo da marinada) e deixa-se estufar em lume muito brando durante cerca de quarenta e cinco minutos. Serve-se preferencialmente com batatas cozidas com a pele.  

 

E este foi o prato que escolhi para provar este novo vinho do Eng. Márcio Lopes, o Pequenos Rebentos Touriga Nacional 3 Barricas Grande Reserva de 2008. Um vinho extreme de Touriga Nacional feito no Vale do Mendiz numa edição limitada de cerca de 900 garrafas (comercializado em caixas de 2 garrafas, com um preço a rondar os € 38,00). Lindo ruby médio na cor, com o lado floral do tourigo pouco presente, com a madeira a aparecer com conta, peso e medida e com um bom corpo. Taninos presentes sem incomodarem e um longo final. É uma interpretação da Touriga Nacional no Douro que joga muito mais na elegância do que na hiperconcentração e muito na aptidão gastronómica. Um vinho muito interessante acrescendo que a reduzida quantidade que foi feita, o torna ainda mais especial. A decantação é obrigatória, já que tem algum depósito por não ter sido filtrado. 
  

domingo, 1 de janeiro de 2012

Do Bacalhau à Conde da Guarda | Quinta do Escudial Branco 2010

"Ler uma receita exige quase a mesma arte que escrevê-la. É texto que namora o enunciado de um teorema na matemática ao mesmo tempo que assenta na complexidade de um soneto. Quando lemos uma receita que sabemos ter sido escrita há muito tempo, confirmamos primeiro a autoridade e idoneidade de quem a escreveu, e então procedemos à exploração simbólica para perceber e reconstruir conhecimento no léxico de hoje." (1)

Surge esta nota a propósito do Bacalhau à Conde da Guarda de Mestre João Ribeiro, que considero uma das grandes preparações de bacalhau e de cuja receita não há, que se saiba, nenhuma versão escrita pelo punho do seu criador.

N'a Cozinha Ideal de Manuel Ferreira (Lisboa, 1933),  a receita (para 4 pessoas) aparece assim transcrita:

250 g de batatas
350 g de bacalhau
3 dl e meio de natas
2 colheres de manteiga.



Coze-se o bacalhau e as batatas e escorrem-se, passando estas pelo peneiro. Escolhe-se o bacalhau de peles e espinhas e pisa-se num almofariz juntamente com os alhos. Retira-se este preparo do almofariz e deita-se numa caçarola. Leva-se ao lume, juntam-se-Ihe a manteiga e a batata e liga-se bem. Adicionam-se-lhe as natas, a pouco e pouco, mexendo sempre com colher de pau até que a massa esteja bem lisa. Tempera-se com sal, pimenta e noz-moscada. Unta-se com manteiga um prato de ir ao forno, deita-se-Ihe o conjunto dentro, alisa-se e polvilha-se com o queijo. Salpica-se com manteiga derretida e leva-se ao forno a corar.
 
Desta receita, muito fica por dizer, nomeadamente no que a quantidades diz respeito, como bem refere o Luís Pontes nesta sua assertiva preparação. Interessantes e adaptadas ao gosto pessoal são estas variações do Prof. João Vasconcelos Costa. Outra proposta aparece aqui, no site do Sol. Todas baseadas na transcrição de Manuel Ferreira.
 
Curiosamente, a neta de Henry Rugeroni (um dos proprietários do Hotel Aviz), Berenice Rugeroni Pestana Cisneiros compilou, em 2000, algumas das receitas da Cozinha do Hotel Aviz, de que transcrevo (aqui numa versão para 6 a 8 doses) a do Bacalhau à Conde da Guarda:
 
1 kg de bacalhau
2 dl de azeite
1 cabeça de alhos
1 cebola média
1 kg de batatas velhas
1/2 litro de natas
sal
pimenta
noz-moscada
manteiga
queijo parmesão
 
Depois de o bacalhau estar de molho durante mais ou menos 24 horas, conforme a espessura, coze-se e tiram-se as espinhas e as peles. Faz-se um refogado com o azeite, os alhos e a cebola picados, sem deixar alourar. Depois, junta-se o bacalhau já desfiado e deixa-se refogar um pouco. Deita-se num almofariz e pisa-se até ficar bem desfeito, numa massa fina. Cozem-se as batatas sem casca e passam-se por uma peneira. Junta-se o puré obtido ao bacalhau, ligando com as natas até ficar num creme não muito fino. Tempera-se ao gosto com sal, pimenta e noz-moscada. Deita-se num pirex barrado com manteiga, polvilha-se por cima com queijo ralado e saplica-se com manteiga derretida. Vai ao forno a corar e serve-se muito quente. Acompanha-se com pedaços de pão frito postos à volta do prato. Serve-se com salada à parte.
Nota: Para esta receita saír bem existem dois ingredientes que devem ser de muito boa qualidade: as batatas e os alhos. Existe mais do que uma versão desta receita de bacalhau, no entanto a que era servida no Aviz Hotel era esta.
 
Muito diferente nos preceitos da receita notada por Manuel Ferreira, esta recolha de 2000... O uso da cebola e o recurso ao refogado parecem desvirtuar completamente a receita publicada n'A Cozinha Ideal. Curiosamente é esta versão refogada e com cebola que vai dar origem a uma série de "receitas adaptadas" (sem referir fontes nem adaptações) de sites que deveriam ter algum respeito pela cozinha. Da vaqueiro, com a sua receitinha, feita naturalmente com margarina, ao bacalhau dias, com a salsa e o leite a pontificar, há de tudo, até um Miguel Castro e Silva brasileiro. Curiosamente, no site igualmente brasileiro do bacalhau riberalves, a receita apresentada denota algum respeito pela "recolha" acima transcrita. Curiosa ainda uma atribuição da receita a Maria de Lourdes Modesto, aqui. Para completar o ramalhete, a apropriação acrítica das colheres inversas com toques de turbo, não poderia faltar... 
 
Poderia dizer-se: impressionante a forma como uma receita de Alta Cozinha se democratizou, abastardando-se nas quantidades e preceitos, se não tivesse acontecido idêntico fenómeno com o Bacalhau à Braz... Só falta ver uma receitinha de perca à conde da guarda :)  
    
"Mas se este exercício de leitura parece complexo, mais difícil ainda é escrever uma receita. Vemo-las hoje por aí, um pouco por toda a parte, quanto a mim quase sempre desperdiçando papel e espaço editorial, porque mais não são do que listas de compras e aplicações desordenadas de técnicas obscuras e passageiras." (1)
 
(1) Fernando Melo, in RV nº 265 de dezembro de 2012.
 

Tendo preparado algumas vezes esta receita a partir d'A Cozinha Ideal, desta vez resolvi juntar a cebola, embora não refogada, numa variante que saiu interessante, embora algo diferente, fazendo perder o que IMHO tornava esta preparação tão especial e que é, ao fim e ao cabo, a não utilização da cebola. Fiz assim:

200 g de batatas
300 g de bacalhau demolhado
2 dentes de alho
1 cebola pequena
2 cs de azeite
2 dl de natas
sal, pimenta e noz-moscada
1 cs de manteiga
30 g de queijo parmesão

Descasquei e cortei as batatas em quartos e meti-as num tacho, com água a cobrir e duas postas de bacalhau por cima. Quando a água levantou fervura, deixei ficar o tempo estritamente necessário para a carne do bacalhau se soltar da espinha e retirei o bacalhau, que limpei de peles e espinhas, deixando as batatas cozer. Piquei a cebola e os dentes de alho e deitei-os num tacho, juntamente com o azeite. Juntei o bacalhau e sobre lume muito brando (sem deixar ferver) fui trabalhando a mistura com uma colher de pau até obter uma pasta homogénea. Quando as batatas estavam cozidas, esmaguei-as com um garfo e juntei as natas. Temperei com o sal, a pimenta e a noz-moscada e juntei à mistura de bacalhau. Envolvi tudo muito bem e deite numa assadeira previamente untada com manteiga. Polvilhei com o queijo parmesão ralado e umas lascas de manteiga. Levei ao forno pré-aquecido a 180º C durante cerca de um quarto de hora a gratinar. Servi com tomate em rodelas, apenas temperado com flor de sal e um fio de bom azeite.


Para acompanhar este prato, desta vez escolhi um vinho do Dão, o Quinta do Escudial branco de 2010. Feito com Encruzado, Barcelo, Malvasia Fina e Rabo de Ovelha. Este vinho foi comprado juntamente com o tinto de que tinha dado nota aqui e tal como ele, foi uma bela surpresa. Com o preço a rondar os € 5,00 (no ECI) é um vinho que foge aos omnipresentes tons cítricos e se apresenta mais mineral e com excelente aptidão gastronómica. Obrigatório conhecer.